quarta-feira, junho 07, 2006

Uma carta

Aqui se publica parte duma carta dum colega:

"1. Sou prof. do ensino secundário há 32 anos.
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Sobre a componente não lectiva e o local da sua concretização,
há problemas ainda não equacionados. Um deles é o da exposição
do professor a ambientes agressivos e ruidosos. De facto, se há
uma parte da componente não lectiva que pode /deve ter lugar
na Escola, para reuniões e outras coisas parecidas, tal parcela
deve ser pequena —reduzida ao mínimo— pelas seguintes razões:

a) as escolas em geral não têm gabinetes para albergar um grande
número de professores em simultâneo; foram concebidas partindo
do pressuposto de que a componente não lectiva é passada fora da
Escola (por exemplo em casa do professor); desse modo, poucos são
os professores que num dado, momento estariam na escola ao
mesmo tempo: quando uns saiam entravam outros.

b) mesmo nas escolas que possuem alguns gabinetes, quase todos
esses gabinetes têm portas que dão para corredores onde passam
alunos a falar aos berros, a gritar intencionalmente, a bater às portas,
etc.; quem é que consegue (eu não consigo!) fazer trabalho útil no meio
do barulho ?

c) também é de considerar o problema nas próprias salas de professores,
onde alguns/algumas colegas não se coíbem de falar alto, mesmo
quando estão a ver outro colega a corrigir testes, a preparar lições, etc.

d) as condições de b) e c) tornam o trabalho da componente não
lectiva (quando prestado na Escola) penoso, triplamente cansativo,
frustrante e de escasso rendimento;

As condições acima referidas propiciam um desgaste acrescido e
inútil por exposição demorada ao ruído. Sabe-se quais são as
consequências a médio/longo prazo de tal exposição excessiva e
ao "stress" dela derivado (os psicólodos e os psiquiatras têm documentação).
É certo que uma escola é, por definição, um local onde se reúne
muita gente, professores, alunos, etc., mas essa exposição ao
ruído deve ser reduzido ao fundamental. Por isso, a não ser que
haja gabinetes acusticamente isolados, vidros duplos, etc., não
será viável o prolongamente exagerado da componente não
lectiva nos espaços das Escolas.


3. Continua a esperar-se do professor um verdadeiro milagre.
No entender dos mais iluminados governantes, trata-se de um
profissional "multifacetado e de largo espectro" que é, ao mesmo
tempo, psicólogo, psiquiatra, assistente social, animador, bom
encaminhador de jovens, divertido, sempre bem disposto e
tranbordante de energia, despistador de casos de uso de drogas,
domador de delinquentes, perspicaz educador e ainda agente
interactivo escola-família-comunidade. Também se pretende
que seja de vez em quando palhaço quanto baste (com a respectiva
bola vermelha no lugar do apêndice nasal) e pouco faltará para
termos de equilibrar uma bola na ponta do nariz, como as focas do circo!
Depois de tudo isto, e como pequeníssimo pormenor, o professor
também **ensina** uma determinada disciplina (Matemática,
Biologia, Português, Física, Inglês, História, etc.). Mas este último
aspecto será (dizem os iluminados) cada vez mais irrelevante, a
bem das primeiras componentes da profissão.

Espero que tenham tido oportunidade de ler um artigo excelente
de Beatriz Pacheco Pereira, publicado no jornal "Público" de
5 de Junho (página 9).


Os meus cumprimentos"
XXXXXXXXX

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