quarta-feira, janeiro 04, 2006

O Balanço

Ano Novo, é sempre tempo de balanço do “ano velho” e sendo assim, “balanceemos”, então um pouco.
Comecemos por apontar as marcas que mais fundamentalmente constituem barreiras ao sucesso escolar para depois tentarmos ver quais foram as medidas actuantes tomadas no concreto relativamente a essas mesmas marcas e assim nos ser possível, no final, fazer um balanço e um juízo de valor.

1º Indisciplina nas aulas e na escola

Qualquer professor com um mínimo de experiência lectiva referirá ser esta uma das marcas do nosso sistema educativo, que mais contribui para o insucesso escolar.
É óbvio que um aluno indisciplinado e desatento, não aprende.
Não é talvez, porém tão óbvio para quem não trabalha no sector, perceber que este tal aluno provoca sempre uma diminuição sensível no rendimento escolar do conjunto dos alunos da turma a que pertence.
Será mais fácil entender isto se se pensar que cada vez que o professor tem de se dirigir ao aluno, durante uma aula, para tentar conseguir alterar o seu comportamento, deixa, enquanto o faz, de poder continuar a acompanhar o trabalho dos restantes.
Se numa turma em vez de um caso de aluno de comportamento inadequado tivermos dois, ou três ou quatro…por vezes são muito mais até, é lógico que daqui resulta uma perturbação muito grande no processo de ensino-aprendizagem da turma toda, resultando daí uma não obtenção das metas previstas para a aprendizagem do conjunto dos alunos da turma.

Quais foram, então, as medidas tomadas pela equipa de Maria de Lurdes Rodrigues, que tanto se afirma preocupada com os níveis de insucesso escolar, relativamente a esta marca?
Não conheço nenhuma medida que tenha sido tomada.


2º Co-responsabilização dos Encarregados de Educação pelo processo educativo dos seus educandos.

Mais uma vez, qualquer professor com um mínimo de experiência lectiva referirá ser esta uma das outras marcas do nosso sistema educativo mais significativas e que se caracteriza na grande maioria das situações, por um completo alheamento dos Encarregados de Educação no que respeita ao dia-a-dia escolar dos seus educandos, isto mesmo quando em alguns casos (e muitos nem isso) se preocupam ao ter conhecimento dos seus resultados escolares.
Fazendo uma comparação, seria como se estando o filho doente e tendo-o levado ao médico, pensassem que depois todo o acompanhamento do processo terapêutico pertencesse ao médico, alheando-se os pais de fazerem a criança cumprir as medicações receitadas e os tratamentos prescritos.
Esta situação tem obviamente, nalguns casos, razões de que se prendem com a indisponibilidade dos Encarregados de Educação, que por falta de tempo, encontram grandes dificuldades em acompanhar o processo educativo dos seus educandos mas nem sequer essa é a situação, em grande parte dos casos em que a disponibilidade até objectivamente existe, a vontade é que não.
É uma verdadeira cultura de desresponsabilização dos deveres funcionais paternais que não se altera fazendo-se crer que uma qualquer sala de estudo ou um qualquer estudo acompanhado é capaz de substituir o acompanhamento familiar da educação das crianças.

Quais foram, então, as medidas tomadas pela equipa de Maria de Lurdes Rodrigues, que tanto se afirma preocupada com os níveis de insucesso escolar, relativamente a esta marca?
Não conheço nenhuma medida que tenha sido tomada.

3º Excesso de carga horária lectiva dos alunos do 2º e 3º ciclos e excesso de professores na mudança do 1º para o 2º ciclo.

Esta é uma marca já por demais conhecida pelo que não vale a pena adiantar muito mais sobre ela e que procurou alterar-se no tempo do ministro Roberto Carneiro.
De então para cá, nomeadamente com a restruturação do funcionamento dos Conselhos Pedagógicos das escolas, o número de professores diferentes que cada aluno encontra ao chegar ao 2º ciclo voltou a ser igual ao que era antes, em muitos casos maior até.
A carga lectiva, adicionada agora pelas áreas não disciplinares, pela formação cívica, ofertas da escola e o mais que adiante se verá, é cada vez maior, roubando tempo individual de trabalho a cada um, que ao chegar a casa cada vez está mais cansado de escola e com menos vontade para se dedicar a estudo individual.

Quais foram, então, as medidas tomadas pela equipa de Maria de Lurdes Rodrigues, que tanto se afirma preocupada com os níveis de insucesso escolar, relativamente a esta marca?
Não conheço nenhuma medida que tenha sido tomada….ou talvez antes pelo contrário!

4º Apoio especial a dificuldades de aprendizagem

Todos sabemos que alguns alunos têm ritmos mais lentos de aprendizagem sem que isso signifique propriamente uma situação que possamos designar por deficiência.
Não estando estes alunos abrangidos pela legislação do ensino especial, necessitam porém, em muitos casos de atenção particular e em muitos casos também, de aulas de apoio pedagógico acrescido ou qualquer coisa parecida com isso.
Obviamente que tal implica a existência nas escolas de um maior número de professores que possam desejavelmente dedicar-se em exclusivo a este tipo de situações.
Isto não tem absolutamente nada que ver com a elaboração de planos em papel, que se traduzem em nada de concreto, a não ser na burocratização de um sistema já de si bastante burocratizado.

Quais foram, então, as medidas tomadas pela equipa de Maria de Lurdes Rodrigues, que tanto se afirma preocupada com os níveis de insucesso escolar, relativamente a esta marca?
As medidas tomadas consistem em mandar elaborar escritos denominados pomposamente planos de isto e daquilo, que não alteram rigorosamente em nada a prática do que se fazia até aqui.
Com, no entanto, a enorme preocupação de divulgar esta nada legislativo, nos mais diversos órgãos de comunicação social para gáudio de quem está por fora da matéria.

5º Apetrechamento didáctico das escolas

Com algumas excepções pontuais, continua ser o velho quadro negro o principal instrumento didáctico das nossas práticas de ensino.
Relativamente a esta marca, podemos bem dizer que estamos praticamente ao nível do 3º mundo, ultrapassados de longe pelos novos países de leste que chegam agora à união europeia.

Quais foram, então, as medidas tomadas pela equipa de Maria de Lurdes Rodrigues, que tanto se afirma preocupada com os níveis de insucesso escolar, relativamente a esta marca?

Talvez a criação dos tais “gabinetes de tabopan” para trabalho individual dos professores….


As marcas referidas são indiscutivelmente aquelas que fazem com que o nosso sistema educativo tenha um nível de insucesso elevado. Deixei de lado outras que poderiam ser aqui também registadas mas cuja influência no dito insucesso é, seguramente, bem mais discutível.

Como compreender, então, que uma equipa governativa que não dá um passo no que respeita a nenhuma destas 5 grandes marcas, consiga, tocando e legislando em questões perfeitamente acessórias causar uma tão grande perturbação no funcionamento do sistema educativo?


Talvez a contradição seja apenas uma aparência: na verdade esta equipa governativa tem enorme necessidade de agitar o sistema, fazer ondas, criar entropia, para ocultar um facto muito simples mas extremamente grave – a sua real incapacidade em fazer seja o que for para resolver as marcas referidas e que são as que realmente constituem as grandes questões do sistema educativo português.

Toda a instabilidade criada no sistema tem afinal, um objectivo único: criar na opinião pública a ideia de que se está a fazer muito, quando não se está na realidade a fazer nada….

Nada…a não ser desmotivar ainda mais Professores, Alunos e Encarregados de Educação.

Este é pois, o balanço objectivo do “ano velho”


Resultado duma política populista no seu estado mais puro.

1 comentário:

Paulo disse...

Não diria melhor. Acrescentaria apenas que a ministra tal qual cidadão comum anda a dar murros na mesa e o povo "curte" o que ninguém percebe, nem a ministra, o impacto negativo que estas medidas terão no sistema de ensino público. Foi dada a ultima facada.

Um abraço