sábado, agosto 04, 2007
A opinião de Helena Matos
Vai grande escândalo na pátria por causa das criancinhas contratadas parafazerem de conta que eram alunos na sessão de apresentação do Plano Tecnológico da Educação. Não percebo porquê. Como sabe qualquer pessoa quetenha os filhos nas escolas públicas, estas não funcionam nesta época doano, logo as criancinhas só por intervenção divina ou contratação terrena ali estariam.Como bem respondeu à jornalista o rapaz que fazia de aluno: "Chamaram-mepara uma publicidade e estou aqui agora." Esta criança é um analista deprimeira linha porque na verdade definiu muito bem não apenas a sua situação mas também a nossa: chamaram-nos para uma publicidade e aqui estamos. Poisnão sendo este Governo o primeiro que chama os portugueses para apublicidade, caracteriza-se pelo facto de não nos suportar em qualquer outra ocasião. Os únicos acontecimentos em que o Governo se sente à vontade sãoaquelas sessões em que nos garante que a nossa vida vai mudar radicalmenteem consequência duma nova tecnologia para a qual o executivo nos vai mobilizar. Estes anúncios sucedem-se a uma velocidade tal que esquecemosrapidamente os anteriores. Por exemplo, onde param os dez milhões de caixasde correio electrónicas que os CTT lançaram em 2006 e que custariam a módica quantia de 2,5 milhões de euros?Contudo, o quadro interactivo agora anunciado pelo Governo é muito maispatético do que a caixa electrónica que os interessados têm de activaratravés duns procedimentos contemporâneos do papel selado. É mais patético porque, ao escutar-se Sócrates a explicar as maravilhas do dito quadro, sepercebe como ele acha que tudo se resume aos adereços. Ao contrário do queafirmou o nosso primeiro-ministro, a relação professor-aluno não muda por causa dum brinquedo que desenha de forma perfeita os ângulos dos losangos. Oquadro interactivo não faz falta alguma ou melhor dizendo faz tanta faltaquanto antes deles fizeram os ainda recentes acetatos ou já os desaparecidos flanelógrafos: se o professor for bom e se a turma estiver motivada, essesobjectos ajudam a tornar mais interessante aquilo que já o é. Casocontrário, ou seja, se o professor for mau e se os alunos não estiverem interessados, então todas essas apregoadas maravilhas se transformam numatralha grotesca.Mais do que os edifícios e do que os equipamentos, as escolas são aspessoas. E não apenas os professores e os alunos. Por exemplo, muitas das mais graves agressões registadas nas escolas acontecem porque existemespaços e horários em que não se avista um funcionário, vulgo contínuo.Quando agora se anuncia a instalação de sistemas de alarme e devideovigilância nas escolas "para protecção externa e salvaguarda do investimento de que os estabelecimentos têm sido alvo", não faria maissentido optar-se por reforçar a componente humana dessa vigilância? Oprincipal objectivo da vigilância, acreditava eu, era a segurança dos alunos, professores e funcionários e só depois a dos equipamentos. Mas aooptar-se pela videovigilância e pelos sistemas de alarme opta-se claramentepor defender o quadro elecrónico e não as pessoas.A escola do futuro anunciada por Sócrates é um local onde as figuras de autoridade como o professor e os funcionários são cada vez mais menorizadase substituídas, nas aulas, pelos quadros interactivos e, nos pátios, pelascâmaras de videovigilância. Esta escola é o resultado dum governo que sofre duma variante da antropofobia aplicada especialmente aos portugueses. Não háinteractividade que nos valha. Jornalista
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